Pesquisadoras brasileiras usaram a unha-de-gato para combater a doença.
Estudo segue sob sigilo com a aplicação de outras espécies.
Morar em um país tropical possui as suas vantagens. Mas o clima quente e as condições geográficas que propiciam aproveitar o sol na praia ou viver cercado pela natureza o ano inteiro também favorecem o aparecimento de algumas epidemias. No Brasil, a combinação de calor mais chuva se tornou um alerta contra a dengue. Mas pesquisadoras brasileiras descobriram que o combate à doença pode vir das nossas próprias matas tropicais. Especificamente, a Amazônia pode conter a solução.
Claire Kubelka, Sônia Reis e equipe, do Laboratório de Imunologia Viral do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), utilizaram um modelo inédito no Brasil para avaliar o potencial farmacêutico de compostos naturais para o controle da dengue. As cientistas empregaram a planta Uncaria tomentosa, popularmente conhecida como unha-de-gato, para obter um resultado positivo contra a doença.
Elas infectaram in vitro monócitos -- um tipo de célula sangüínea que pode apresentar problemas para pacientes na fase aguda da doença -- com o vírus da dengue do tipo 2. “Poderia ser de qualquer tipo”, conta Reis. Em seguida, estudaram o efeito de três amostras da planta no combate ao vírus.
As amostras foram extraídas da casca do caule da unha-de-gato: um extrato bruto, uma enriquecida com alcalóide -- composto natural com atividade farmacológica -- e outra sem essa substância. “O resultado mais promissor obtivemos das amostras enriquecidas com alcalóide. Percebemos uma ação antiinflamatória e antiviral”, diz a pesquisadora.
O trabalho mostrou uma diminuição de até 19% da replicação de substância nociva que estimula a produção de anticorpos dentro das células tratadas com a planta.
Todos por um
“Praticamente todos os outros estudos anteriores usaram células de uma única linhagem, o que gera sempre a mesma reação à substância”, conta Reis. No atual trabalho, as células estudadas são de pessoas diferentes. “Procuramos reproduzir no laboratório a diversidade de reações que de cada organismo possui contra dengue, como acontece na vida real.”
As células do sistema imunológico de algumas pessoas produzem uma quantidade muito grande de citocinas -- proteínas relacionadas à gravidade da doença --, o que leva a quadros graves e à morte. Os alcalóides inibem a produção delas. Agora, as pesquisadoras buscarão entender se os alcalóides foram os responsáveis pelo combate ao vírus ou se foi uma ação simultânea entre substâncias envolvidas.
Bonito por natureza
A unha-de-gato é empregada para finalidades medicinais na Amazônia. A planta possui efeitos imunomoduladores -- que alteram o curso da doença -- e antiinflamatórios já comprovados cientificamente. “Mas ela está patenteada, por isso nosso próximo passo será estudar outras plantas também brasileiras”, conta Reis.
As cientistas acreditam que podem encontrar espécies ainda mais eficazes. “Temos uma flora diversificada”, afirma Reis. Porém, quais substâncias serão estudadas seguem sob sigilo.
Apesar dos resultados positivos, as pesquisadoras alertam: “Não se deve utilizar a unha-de-gato como tratamento contra a dengue. A pesquisa ainda está no início, desconhecemos os efeitos colaterais”. Todas as diversas substâncias precisarão passar por muitos testes antes de chegarem à população.
A ausência de medicamentos específicos é um dos principais desafios dos pesquisadores. O tratamento hoje em dia consiste em amenizar os sintomas da infecção. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 20 mil pessoas -- de 50 milhões a 100 milhões que se infectam por ano -- morrem devido à dengue em mais de cem países. No Brasil, atualmente cinco municípios estão em estado de risco de ocorrência de surto de dengue e outros 71, entre eles 14 capitais, em alerta.
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